“A mulher tem de estar presente como editora, como jurada dos prêmios literários, como promotora de eventos literários”

“A mulher tem de estar presente como editora, como jurada dos prêmios literários, como promotora de eventos literários”

Escritora Georgina Martins traça um paralelo entre mulher e literatura

Com o livro “Há muitas formas de se fazer macarrão – e outras brutalidades”, a escritora e professora de Literatura Georgina Martins coloca a mulher como protagonista na narrativa que traz um perfil tão presente na sociedade brasileira: a que se divide entre o trabalho, os afazeres do lar, a criação dos filhos e, ainda por cima, sofre a violência velada no casamento. Tendo a mulher como personagem central neste seu primeiro romance para adultos, a escritora traça abaixo um paralelo da figura feminina e a literatura.

Como você analisa o papel da mulher na literatura brasileira nos últimos 10 anos?

Muita coisa mudou nos últimos dez anos, inclusive a atuação da mulher na sociedade de uma maneira geral, e isso reflete na participação dela na literatura, saindo do lugar de personagem dos homens escritores para ocupar o de escritora, o de protagonista da sua própria vida. Se nos séculos XVII, XVIII e XIX ela cuidava da casa e dos filhos para que seus maridos escritores pudessem escrever e brilhar, hoje ela ocupa esse lugar  trazendo questões muito específicas e femininas para literatura, como a luta para sustentar os filhos, a menstruação, o parto, o aborto, a violência doméstica, o prazer, o erotismo, e etc.

Acredita que a mulher está mais aberta para mostrar suas dores e insatisfações através da literatura?

Sim, sobretudo porque ela precisa fazer isso, como denúncia, catarse, respiro e militância. Precisa fazer-se ouvir.

Os diversos meios digitais, como blogs e redes sociais, encorajaram muitas mulheres a entrarem para a literatura?

Certamente, pois ela tem mais acesso, pode fazer isso de casa, o que facilita muito para as mulheres que têm filhos, para as que não contam com nenhum tipo de apoio, ou por não terem homens em casa, ou por eles não assumirem o papel doméstico junto com elas. Então os meios digitais facilitam muito porque elas podem escrever nos intervalos da lida diária. O que não é a condição ideal, mas é o que se tem.

Você acha que a mulher está mais representada nos livros?

Ela sempre foi representada, mal ou bem, nos livros escritos por homens, mas sempre através da voz masculina e isso mudou, felizmente. Hoje ela é protagonista

Na sua opinião, o ambiente literário ainda é dominado por homens? Se sim, como alavancar a mulher neste cenário?

O ambiente literário ainda é muito dominado por homens, mas começa a mudar. A mulher tem de estar presente como editora, como jurada dos prêmios literários, como promotora de eventos literários. No entanto, o fato de ser ela sempre quem cuida dos filhos, acaba por prejudicar essa participação na vida literária. Nesse sentido, as mulheres precisam de políticas públicas de implantação de creches, de escolas em horário integral, de trabalho com remuneração decente. Para que ela não precise se preocupar se os filhos têm ou não comida na mesa.

Dê um panorama da representação das mulheres em suas obras literárias.

  1. Nos meus livros, mesmo o que são para crianças e jovens, a mulher sempre aparece como a mãe que trabalha, que precisa sustentar a casa porque o pai é ausente. Ela tem sempre o papel de protagonista. Mesmo quando são meninas ainda, elas têm voz, tem desejos, atuam na sociedade. Nunca estão esperando as coisas acontecerem.

Em dois livros meus, Uma Maré de desejos e Em busca do mar, eu falo de mães que precisam mudar de cidade para encontrar trabalho e por isso deixam as filhas com tias, com avós.

Georgina Martins é carioca, geminiana, professora, escritora e colunista da Revista Ciência Hoje. Doutora em Literatura brasileira e especialista em Teoria e Crítica da Literatura Infantil e Juvenil. É autora de O Menino que brincava de ser, Minha família é colorida, Uma maré de desejos, Em busca do mar, entre outros títulos.

Instagram – @martins_georgina